Não vou aqui empilhar mais teorias sobre o mundo digital. Prefiro perguntar por que sua marca ainda não aposta de verdade no binômio “Influência x WOM” (Word of Mouth, o famoso boca a boca) em um contexto que se diz orientado ao usuário?
Talvez seu imaginário foi posto a imaginar uma lista de argumentos que possam te fazer desistir desta ferramenta que parece ser extremamente subjetiva e próxima de um cancelamento pelo usuário. Mas, como tudo na vida, entrar na sombra desta poderosa ferramenta só vai depender de uma gestão equilibrada em comunicação.
Quase sempre empurrado para a vala comum do “não é para mim”, esse binômio “Influência x WOM” está aí, disponível, e merece outra posição no mix de Marketing, especialmente por sua alta efetividade e, não menos importante, altíssima relevância.
Este artigo apresenta números, fatos e raciocínios que mostram por que a ferramenta deixou de ser uma estratégia isolada para ser uma alavanca premium de vendas ao alcance de qualquer negócio.
Diariamente em todas as telas
Conteúdos produzidos por criadores e influenciadores fazem parte do dia a dia de qualquer usuário de plataformas digitais (ou seja, todos nós, todos os dias, em todas as horas). Disso ninguém tem dúvida. De que esses conteúdos rejuvenescem a imagem da marca, também não.
A abrangência dessa ferramenta, de acordo com pesquisa da IAB Brasil realizada no ano passado, atinge 9 entre 10 brasileiros. Ela é o instrumento de Marketing mais ubíquo dentre todas as ferramentas do marketing mix – algo que talvez seja novidade.
A mesma pesquisa da IAB, chamada “O impacto da creator economy entre gerações no Brasil”, aponta para uma realidade ainda mais intrigante: 8 entre 10 brasileiros de todas as gerações já compraram produtos recomendados por influenciadores e se consideram satisfeitos com a maior parte dos produtos recomendados.
Mas, você pode estar falando consigo mesmo: “Ah, esse é um artifício de Marketing para as grandes marcas, que têm tamanho e verbas para contratar grandes influenciadores, certo?” Errado.
O estudo americano “The Surprising ROI of Small Online Influencers” (“O ROI surpreendente de Pequenos Influenciadores”), realizado no final do ano passado pela MIT Sloan, escola de negócios do MIT de Boston, nos Estados Unidos, mostra que nano influenciadores têm taxas de conversão de vendas significativamente maiores que os de perfis grandes. Ou seja, influenciadores com menor custo e mais acessíveis à qualquer marca.
Em uma amostra desta pesquisa, 7% dos usuários engajados transformam a relação com influenciadores locais em interesse pelo produto ou vendas, um percentual bastante significativo se comparado ao de outras estratégias. E-mails marketing, malas diretas, WhatsApps e SMSs, por exemplo (e numa generalização apenas didática), alcançam taxas de até 3%, ou seja, menos que a metade que a dos influenciadores.
É claro que ações integradas de ferramentas no marketing mix podem alavancar os retornos a uma taxa maior, como é o caso de muitas campanhas com e-mail marketing que chegam uma abertura média 11,9% e taxa de clique por abertura (CTOR) de 4,7%. Mesmo assim, elas só rivalizam com a taxa de eficiência dos influenciadores.
Influenciadores e o boca-a-boca: combinação de causa e efeito no marketing atual
O trabalho com influenciadores funciona quando não para no post. A exposição inicial precisa transbordar para conversas entre consumidores, avaliações e indicações. Essa continuidade desejada é o WOM (Word of Mouth). Quando aplicamos essa técnica, a influência convence, o WOM confirma e a venda acontece com menos atrito.
Um estudo global feito pela empresa de pesquisa Nielsen em 2021, com 40 mil entrevistados em 56 países, incluindo o Brasil, mostrou que 88% dos consumidores disseram que confiam mais em recomendações de pessoas que conhecem do que em qualquer outra forma de mensagem de Marketing.
Na lógica do marketing digital nas plataformas, temos um encadeamento de atividades:
- WOM é um efeito comportamental – pessoas recomendam, outras confiam e agem.
- Influencers são os que aceleram esse efeito, concentram atenção e confiança.
- Creator Economy é o ecossistema que viabiliza e remunera essa aceleração – plataformas, formatos, contratos, métricas e monetização.
Em cadeia, fica assim: conteúdo do creator > atenção e confiança > recomendação explícita ou implícita > WOM digital ou offline > conversão e recorrência > dados e renda para o creator > reinvestimento em conteúdo. É uma espécie de loop.
Um manual didático da prática para você ou sua agência
São três correlações práticas que não podem deixar de existir nesta seara:
- Causa e efeito – quanto maior a “exposição qualificada” a creators (gente certa + contexto certo + formato certo), maior a propensão ao WOM no entorno do consumidor. O conteúdo cria linguagem, prova social e uso-modelo que as pessoas repetem no privado (grupos de WhatsApp, DMs, conversas, etc.).
Gente certa: alta sobreposição entre a audiência do creator e seu público-alvo.
Contexto certo (as dores do usuário): momento/tema em que a dor do usuário está ativa (ex.: “volta às aulas”, “Black Friday”, “pele oleosa no verão”).
Formato certo: conteúdo que dá para copiar, colar e encaminhar (reels curtos, carrossel com passo a passo, lista “3 motivos para”, etc.). - Interface de confiança – O impacto do creator na venda é mediado pela confiança. A mesma mensagem performa mais quando o emissor tem credibilidade no mesmo segmento que o produto está. Confiança e proximidade ativam o WOM com menos atrito.
- Algoritmo modera, mas sem sua gestão – A distribuição algorítmica das plataformas modera o alcance do WOM. Formatos nativos (aqueles feitos especificamente para aquela plataforma), sinais de engajamento (talento do influencer em viralizar o discurso) e timing determinam se a recomendação “pega”.
Sem distribuição, o WOM morre no feed; com distribuição, vira “conversa para a massa” se deliciar.
Quando esses três elementos “batem” (se alinham), o conteúdo vira referência pronta porque ele fornece ao usuário a linguagem (termos, frases e molduras fáceis de repetir como “rotina 3X3”, “efeito segunda pele”, “hack de 2 cliques”), prova social (antes/depois, depoimento, número de pessoas usando, selo/nota) e “bula” (quando usar, para quem serve, como aplicar, quanto custa).
Com Linguagem + Prova + Bula, a pessoa se sente segura para recomendar no privado (WhatsApp, DMs, grupos em geral). É o gatilho do boca a boca: “lembrei de você”, “segue o link”, “olha o passo a passo”, etc.
Sem qualidade da oferta, nenhuma estratégia digital se sustenta
Pedi para o ChatGPT me mostrar uma lógica de como funciona o mecanismo todo da influência e ele me trouxe o seguinte resultado: Vendas por Influência = Alcance Qualificado x Confiança Percebida x Relevância do Uso (produto) x Força da Oferta x Conversão Pós-clique.
Vamos combinar uma coisa? A Força da Oferta é um elemento integrante da equação e pode destruir um projeto de influência e WOM.
Portanto, o princípio básico do Marketing, já há mais de uma centena de anos, também se aplica nesta estratégia de marketing digital. Sem uma oferta (produto ou serviço) de qualidade, ela não fica de pé. Se o seu serviço for uma espécie de commodity, se sua oferta não tiver diferenciação, se não for algo exclusivo ou inédito, seu projeto de Influência e WOM terá, sim, resultados – mas tacanhos.
Vamos a um exemplo rápido no segmento de beleza.
Uma influenciadora (criadora) de skincare, contratada por uma marca de beleza, mostra a “rotina 3 passos para pele oleosa no verão”. Frases replicáveis, antes/depois e link do kit. A seguidora encaminha no grupo das amigas: “É a sua cara; custa X e dura Y”. O WOM nasce desse contexto completo. Mas, se o produto for um “me too” ou cópia dos que já existem, a ação terá uma replicação excepcionalmente menor.
Mas quais as métricas de eficiência neste tipo de ação?
Não bastasse a medida pura de incremento real de vendas, todo o processo de influência e WOM é suficientemente “traqueável” e ao longo do projeto, uma vez que ele mesmo vai dando pistas para ajustes, se necessário.
São vários as métricas (os KPIs) que evidenciam resultado: a proxy de um post “replicável” com um bom número de compartilhamentos e salvamentos; cliques por links encaminhados (esses especificamente para WhatsApp e DMs); campos “como nos conheceu”, com opção de creator X/indicação (no checkout ou formulário, códigos específicos de vendas para os creators); lifts de marca e avaliações/reviews na janela pós-post, etc.
Ao longo do tempo, o lifetime value (LTV) para aquisição do cliente vai dando indicação de performance das ações; a calibragem das ações vai otimizando o LTV, denotando evolução na ferramenta.
Mas ainda não falamos de algo importante neste artigo e que talvez seja o maior empecilho para sua entrada neste universo. A ideia de que Influência é um jogo de alto risco e, portanto, de perdas acima do sustentável para um negócio.
Estou falando do cancelamento, da subjetividade da escolha de um influenciador (por maior ou menor que seja) e, acima disso tudo, da falta de controle do discurso nas mãos da marca.
Riscos & ganhos: os gestores de marca com medo do cancelamento
Como já dizia o velho ditado no segmento de investimentos financeiros: “Quanto maior a aposta no investimento de risco, maiores são os ganhos”.
O uso de influenciadores e das estratégias de participação dos usuários – UGC (User Generated Content) – para sua marca faz parte de uma espécie de risco maior ou, numa conceituação necessária, um novo olhar de gestão de marca. A técnica permite a participação efetiva dos stakeholders na construção de reputação dela.
É claro que existem técnicas de proteção para as marcas nesse tipo de gestão, mas o frio na barriga de deixar a opinião pública participar dela é inexorável. Desapegar da propaganda tradicional, que tem por premissa o controle da mensagem, uma vez que essa mensagem é unilateral da própria marca, é condição sine qua non neste novo jogo de gestão.
O desapego do controle e centralização das ofertas de marca – digo, em comunicação – está se fazendo absolutamente necessário. Compartilhar e abrir mão de um pedaço do controle da narrativa faz parte da gestão de marca contemporânea e, especialmente, do processo desta técnica.
Mas isso não significa improviso. Quando se opta pelo caminho da influência e do WOM, um conjunto de providências de gestão de comunicação precisa ser adotado:
- Consolidação da identidade da marca: o que ela é e o que ela não é.
- Mapeamento do que a marca permite cocriar: do que abre mão e do que não.
- Identificação de territórios sensíveis e linhas vermelhas.
- Governança com comitê de influência e crise; compliance, cessão de direitos.
- Mensagens-chave como guia de ações, nunca como estratégia redacional.
- Curadoria de conteúdo e UGC; etc.
Ou seja, um conjunto de novas atividades de gestão de marca entra em jogo.
Se a sociedade do espetáculo colocou todos no palco, cabe às marcas transformar palco em caixa de presente. O caminho não exige fé, mas método. Abrir mão do controle absoluto assusta, mas é assim que a influência vira conversa, a conversa vira venda e a venda vira recorrência. O resto, quer dizer, publicidade tradicional, vira ruído.
Ulisses Zamboni – Chairman & Sócio
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